Recentemente, o Supremo Tribunal Federal editou nova Súmula Vinculante, de nº 49, que reconhece que:

“Ofende o princípio da livre concorrência lei municipal que impede a instalação de estabelecimentos comerciais do mesmo ramo em determinada área.”

Em vários Mandados de Segurança a Guirão Advogados defendeu essa inconstitucionalidade e garantiu a instalação de estabelecimentos comerciais aos empresários clientes.

É que a Livre Concorrência, enquanto expressão de direito individual à Liberdade de Iniciativa privada, constitui-se num Princípio Constitucional e ainda num direito líquido e certo de qualquer empresário ou sociedade empresária. Regulando a distância mínima entre estabelecimentos da mesma natureza, a municipalidade viola o artigo 1º, inciso IV da Constituição Federal que vaticina:

Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:
(…)

IV – os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa; (Destacamos)

No Título que trata da Ordem Econômica e Financeira, a Constituição Federal reforça o entendimento no artigo 170, que diz:

Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios:
(…)
II – propriedade privada;
III – função social da propriedade;
IV – livre concorrência;

Parágrafo único. É assegurado a todos o livre exercício de qualquer atividade econômica, independentemente de autorização de órgãos públicos, salvo nos casos previstos em lei.

Ou seja: a LIVRE INICIATIVA DE EXERCÍCIO DA ATIVIDADE EMPRESARIAL, CONDUZIDA, AINDA, PELO PRINCÍPIO DA LIVRE CONCORRÊNCIA.

O Professor José Afonso da Silva em sua Obra Curso de Direito Constitucional Positivo, 17ª Edição, publicado pela Editora Melhoramentos, pg. 767, lecionou que

“a liberdade de iniciativa envolve a liberdade de indústria e comércio ou liberdade de empresa e a liberdade de contrato.”

Muitas Leis Municipais, anteriores mesmo à nova ordem Constitucional (e até algumas delas editadas após a vigência da Constituição da República) continuam intentando inibir a instalação de farmácias, postos de combustível, floriculturas e até funerárias.
De se concluir que normas como essas são inconstitucionais e poderiam ter sido revogadas pelo Município. Se não o foram, ou poderão o ser pela via direta (Ação Declaratória de Inconstitucionalidade) ou pela via indireta (Declaração Incidente em Mandado de Segurança ou outra ação).
A Lei, por ser ato inferior na hierarquia das normas, já não poderia fixar mandamento distante da Lei Maior, estabelecendo limitação à livre concorrência. Sendo assim declarada de constitucionalidade duvidosa, não pode servir de motivação para a prática de ato administrativo que resta tão contaminado quanto a própria lei.
Em suma, estabelecer limites espaciais para instalação de atividades congêneres fere a livre iniciativa e a livre concorrência, sendo a primeira liberdade um dos fundamentos do Estado Brasileiro e a seguinte princípio informante da ordem econômica, direitos líquidos e certos assegurados constitucionalmente.
Em última análise, preterir a pretensão de instalação de estabelecimentos concorrentes dá azo ao surgimento de reserva de mercado, contrário aos interesses dos empresários, mas também dos CONSUMIDORES, ferindo outro Princípio da Ordem Econômica, o da defesa dos interesses do consumidor (art. 170, V da Constituição Federal).
É que não há como negar que a oferta de serviços em maior escala, por concorrentes distintos e diretos, estimula a prática concorrencial entre os players do mesmo ramo, com benefícios infinitos para o Consumidor.
A jurisprudência do Tribunal de Justiça de São Paulo já tinha esse entendimento:

INSTALAÇÃO DE FARMÁCIA/DROGARIA LEI MUNICIPAL QUE CRIA RESTRIÇÃO TERRITORIAL Não pode a legislação regulamentadora do direito de livre iniciativa criar proibições irrazoáveis A pluralidade de oferta beneficia a população, atendendo, em última análise, ao interesse público primário Direito líquido e certo presente Precedentes Sentença concessiva da ordem mantida. Preliminar afastada. Recurso improvido. (TJSP – APELAÇÃO CÍVEL Nº 9160006-18.2006.8.26.0000 de Mauá – Relator: Des. Moacir Peres – v.u. – julgado em 05/09/2011)

Mandado de Segurança – Drogaria – Lei n” 4.309, de 1994 do Município de Mogi das Cruzes – Proibição de instalação dentro de um raio de 200 (duzentos) metros entre estabelecimentos congéneres – Competência municipal para o zoneamento da cidade que não chega ao ponto de impedir a instalação de nova farmácia em face de outra já existente, sob pena de afronta aos princípios constitucionais da livre concorrência, da defesa do consumidor e da liberdade do exercício das atividades econômicas – Precedentes da Suprema Corte – Sentença de concessão parcial da segurança – Desprovimento dos recursos. (TJSP – APELAÇÃO CÍVEL Nº 9256771-85.2005.8.26.0000 de Mogi das Cruzes – Relator: Des. Osvaldo Magalhães  – v.u. – julgado em 11/07/2011)

MANDADO DE SEGURANÇA. Lei Municipal n. 3.607/97 que limita a instalação de auto-escolas desde que não observada à distância mínima de 500 metros. Impossibilidade. Ofensa ao princípio da livre concorrência e da liberdade de iniciativa econômica privada. Exegese dos artigos 170 e 173, parágrafo 4o, da Constituição Federal. (TJSP – APELAÇÃO CÍVEL Nº 0261256-48.2009.8.26.0000 de São Caetano do Sul – Relator: Des. Vera Angrisani  – v.u. – julgado em 10/11/2009)

A rigor da Jurisprudência em destaque, por contemplar matéria que fere a Constituição da República, o Supremo Tribunal Federal já regulava a questão pela Súmula 646 abaixo em destaque:

Súmula 646
OFENDE O PRINCÍPIO DA LIVRE CONCORRÊNCIA LEI MUNICIPAL QUE IMPEDE A INSTALAÇÃO DE ESTABELECIMENTOS COMERCIAIS DO MESMO RAMO EM DETERMINADA ÁREA. (Aprovação em Sessão Plenária de 24/09/2003 – Publicação no DJ de 9/10/2003, p. 2; DJ de 10/10/2003, p. 2; DJ de 13/10/2003, p. 2.)

Agora, com os rigores a que se destina, a matéria está regulada pela Súmula Vinculante nº 49, sendo determinante para conferir o tratamento isonômico e constitucional a todos os empresários que pretenderem implementar a Livre Concorrência.
Certamente, os empresários ainda encontrarão óbice à instalação de seus estabelecimentos, pois, apesar das facilidades do Sistema Integrado de Licenciamento – SIL (www.sil.sp.gov.br), as respostas automatizadas e standartizadas ainda serão prestadas enquanto as leis inconstitucionais não forem revogadas.
O caminho, portanto, ainda é a propositura de Mandado de Segurança, após a negativa de licenciamento, com pedido de liminar. Mais efetivo agora, portanto, com a vigência da Súmula Vinculante de nº 49.

Alexandro Rudolfo de Souza Guirão – advogado e sócio do escritório Guirão Advogados – a.guirao@guirao.com.br